Uma decisão do Conselho Pleno do Conselho de Contribuintes do Estado do Rio de Janeiro entendeu que os créditos do ICMS gerados por meio da compra de bens para o ativo fixo podem ser utilizados no período pré-operacional da companhia. Muitas empresas que se encaixam nessa situação tiveram seus créditos cancelados por uma interpretação do Fisco carioca de que é indevido esse aproveitamento quando ainda não existe saída de mercadorias do empreendimento. O conselho de contribuintes é um tribunal paritário - com representantes dos contribuintes e da Fazenda - responsável por julgar processos que contestam autuações fiscais.
O processo administrativo analisado em julho pelo conselho envolve uma empresa do ramo de cimento. De acordo com a advogada que atua no caso, Hevelyn Brichi Cardozo, do Bichara, Barata & Costa Advogados, a companhia foi autuada em aproximadamente R$ 11 milhões em 2008. Na época, a empresa não estava em operação, mas comprou máquinas que integrariam seu ativo fixo e utilizou, posteriormente, o crédito obtido por meio dessa operação.
A Fazenda estadual, entretanto, entendeu que a ação infringiu o artigo nº 33 da Lei nº 2.657, de 1996, que trata do ICMS no Estado, e cancelou os créditos. A norma, nos moldes da Lei Complementar nº 87 (Lei Kandir), de 1996, estipula que em casos de operações para aquisição de bens do ativo fixo o crédito deverá ser utilizado em 48 meses. "A lei entende que o ativo não é consumido imediatamente, mas sofre desgaste ao longo do tempo e, por isso, a necessidade de parcelamento", afirma o advogado Marcelo Jabour, diretor da Lex Legis Consultoria Tributária.
O valor a ser aproveitado em cada parcela é o resultado de um cálculo que divide as saídas de mercadorias tributadas pelo total de saídas realizadas pela empresa no mês. Nos casos de companhias que ainda não entraram em funcionamento e, portanto, não venderam nenhuma mercadoria, o cálculo é impossível, o que leva o Fisco a autuar as empresas que utilizaram os créditos obtidos no período.
Ao reformar a decisão da 3ª Câmara do Conselho de Contribuintes, o conselho pleno cancelou o auto de infração aplicado à empresa, possibilitando que ela utilize integralmente os créditos. A maioria dos conselheiros entendeu que a lei não previu a situação do processo, apesar de autorizar o uso de créditos de bens do ativo fixo.
De acordo com Hevelyn, o fato de a lei não prever essa situação pode causar inclusive o não aproveitamento total do crédito. "Empresas que ficam cinco anos em fase pré-operacional perdem o crédito, por prazo prescricional", diz.
Da mesma forma, como a primeira parcela deve ser aproveitada no mês em que o bem é adquirido, existe a possibilidade de as companhias conseguirem aproveitar apenas parte do crédito. "Se a empresa tiver uma fase operacional de três anos, estaria jogando 75% do crédito desse ativo no lixo" afirma o advogado Otto Sobral, do Mussi, Sandri e Pimenta Advogados.
Sobral destaca ainda que o volume de aquisições durante a fase pré-operacional é alto e os valores dos bens adquiridos são igualmente grandes. Por esse motivo, a não utilização desse crédito significaria uma perda considerável à empresa.
O advogado Daniel Mariz Gudiño, do Dannemann Siemsen, diz que a decisão do Conselho de Contribuintes do Rio de Janeiro é um precedente importante e que o escritório já atendeu diversas empresas autuadas por utilizarem créditos de ICMS na situação descrita no processo. "A decisão abre um precedente para que as empresas que estejam nessa situação possam pleitear o direito à manutenção desses créditos", diz. Segundo ele, a decisão terá mais força no Rio de Janeiro, mas a interpretação poderia ser utilizada por contribuintes de outros Estados.
Pelo menos dois Estados brasileiros já regularam a tomada de crédito de bens do ativo imobilizado durante a fase pré-operacional. O Paraná e Minas Gerais estipularam que o crédito poderá ser utilizado apenas após o início das atividades das empresas.